Memória e homenagem: mulheres que pavimentam a Região Nordeste
- projetovielas2025
- 5 de mar.
- 7 min de leitura
Atualizado: 7 de mar.
REGIÃO NORDESTE
por Clarisse Benony e Maria Eduarda Pacheco
A região nordeste de Juiz de Fora destaca-se por sua relevância no contexto urbano e econômico do município. Compreendendo bairros como Eldorado, Grama, Filgueiras e Santa Cruz, essa área apresenta uma combinação de zonas residenciais e comerciais, refletindo o crescimento e a diversificação da cidade. As principais vias de acesso aos bairros da região nordeste também servem como importantes rotas de entrada e saída de Juiz de Fora, facilitando a conexão com cidades vizinhas e contribuindo para o fluxo econômico e logístico da região.
A área abriga instituições educacionais, unidades de saúde e espaços de lazer, atendendo às necessidades da população local. Atualmente, constam na região 56 ruas com nomes de mulheres, homenageadas por feitos desde a saúde, educação até apoio a comunidade local.
Distribuição de ruas com nomes de mulheres em Juiz de Fora

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Ao caminhar pelas ruas da região nordeste de Juiz de Fora, muitos nomes femininos se destacam nas placas, mas poucos conhecem as histórias por trás dessas homenagens. Quem foram essas mulheres e qual foi o impacto de suas trajetórias na cidade? Vamos conhecer seis dessas personalidades: Francisca Lopes, Darcylia Braga de Nobrega, Nhá Chica, Patrocínia Teixeira da Fonseca, Rua Ana Maria da Fonseca e Maria Conceição Riani.
A luta pela educação de qualidade
Rua Professora Francisca Lopes

A Professora Francisca Lopes, foi a primeira diretora da Escola Estadual Antônio Carlos, em Juiz de Fora, de 1909 a 1934. Durante sua gestão, a instituição enfrentou desafios significativos, incluindo condições inadequadas de infraestrutura e higiene. Em 1911, Francisca Lopes solicitou ao Secretário do Interior melhorias nas instalações, destacando a falta de limpeza e ventilação adequadas, o que comprometia a saúde dos alunos e professores.
Em 1914, o Grupo Escolar de Mariano Procópio, sob sua direção, passou a funcionar em um prédio provisório que também encontrava-se em condições precárias. Após reformas, a falta de limpeza e problemas com a ventilação continuaram a afetar o ambiente escolar. A educação, na época, enfrentava não só no currículo e na falta de oferecimento de oportunidades, mas problemas estruturais como esse.
Em reconhecimento ao seu legado e dedicação à educação, uma das ruas da cidade foi nomeada em sua homenagem, no bairro Eldorado, a Rua Francisca Lopes, uma mulher que pavimentou a educação em Juiz de Fora.

Da contabilidade à saúde pública, um legado de gestão e compromisso
Rua Darcylia Braga de Nobrega
Darcília Braga de Nóbrega nasceu em 6 de outubro de 1922, em Escada, Pernambuco. Formada em Ciências Contábeis, dedicou grande parte de sua carreira profissional à Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais, contribuindo significativamente para a gestão da saúde pública no estado. Em reconhecimento aos seus serviços, uma rua no bairro Quintas da Avenida, em Juiz de Fora, foi nomeada em sua homenagem.

Além disso, a Associação dos Moradores do Bairro Quintas da Avenida está localizada nesse logradouro, reforçando a importância de seu legado na comunidade local. Infelizmente, não foram encontrados registros fotográficos disponíveis de Darcylia.
Resistência e fé: a beata afro-brasileira
Rua Nhá Chica
Nhá Chica, nascida Francisca de Paula de Jesus em 1808 na cidade de Santo Antônio do Rio das Mortes, distrito de São João del-Rei (MG) e viveu em Baependi (MG). Foi uma mulher afro-brasileira, ex-escravizada e uma das figuras mais respeitadas da história do Brasil. Ela passou grande parte de sua vida como escravizada e, após a liberdade, dedicou-se à vida religiosa e à ajuda aos necessitados, tornando-se uma referência de fé e caridade em sua comunidade.
Após sua libertação, ela passou a viver em Baependi, uma cidade no sul de Minas Gerais, onde ficou conhecida por sua profunda espiritualidade, virtudes e pela prática de curas e milagres. Apesar de nunca ter sido oficializada como santa durante sua vida, Nhá Chica foi consagrada como Beata pela Igreja Católica. Uma santa popular em Minas Gerais, por suas orações, ajuda aos pobres e enfermos, além de sua devoção intensa, tem sua imagem associada à resistência, à fé e à transformação social, e como símbolo de espiritualidade e força, especialmente em comunidades negras e periféricas. Em 2013, a Igreja Católica abriu o processo para sua beatificação, consolidando sua santidade no imaginário religioso brasileiro.

A cidade de Juiz de Fora carrega em suas ruas histórias pouco conhecidas de mulheres que deixaram sua marca, seja por seu papel na comunidade ou pelos laços familiares que as ligavam ao local. No entanto, muitas dessas homenagens permanecem invisíveis para os próprios moradores, demonstrando o quanto ainda há a ser feito para resgatar e valorizar a memória feminina nos espaços urbanos.
O projeto Vielas mapeou algumas dessas ruas e reuniu suas histórias. A zona Nordeste carrega o nome de 58 mulheres em suas ruas, e três das ruas escolhidas para terem suas histórias contadas estão localizadas no bairro Filgueiras, dessa maneira, é pertinente entender o contexto em que essas mulheres estão inseridas.
Localizado na Zona Nordeste de Juiz de Fora, o bairro Filgueiras possui uma história peculiar. Originalmente pertencente ao município de Chácara, a área passou a integrar Juiz de Fora, mas muitos de seus registros oficiais ainda se encontram divididos entre as duas cidades ou simplesmente se perderam ao longo do tempo. Isso contribui para a dificuldade de documentação e reconhecimento da história local.
A Moradora Pioneira
Rua Patrocínia Teixeira da Fonseca

A Rua Patrocínia Teixeira da Fonseca, localizada no bairro Filgueiras, foi oficialmente denominada pela Lei nº 13.794, sancionada em 2018. Antes disso, era conhecida apenas como Estrada "1". No entanto, mesmo com a mudança, a via ainda é desconhecida por muitos moradores da região, que se lembram apenas da rua de seu marido, Manoel Teixeira.

Conhecida como "Dona Cininha", Patrocínia Teixeira da Fonseca nasceu em 13 de julho de 1925, em Chácara, Minas Gerais. Casada e mãe de quatro filhos, era uma figura central na comunidade. Sua família possuía terras extensas na região, e seu marido, um fazendeiro influente, mantinha uma balança de pesagem de gado que atraía diversos pecuaristas.
Por sua irmã ser produtora de aves, Patrocínia costumava custear as prendas da tradicional Festa de São Geraldo com frangos assados, e Dona Cininha também contribuiu ativamente para os eventos da Escola Municipal Marília de Dirceu.
Embora tenha sido uma personalidade marcante para a comunidade, a falta de registros sobre sua rua e a pouca circulação de informações contribuem para o apagamento da memória de Patrocínia. Seu nome resiste, mas sua história precisa ser mais divulgada para que sua trajetória não caia no esquecimento.
Laços de Família
Rua Ana Maria da Fonseca

Diferente de outras ruas nomeadas em homenagem a figuras comunitárias, a Rua Ana Maria da Fonseca tem uma origem distinta. O pequeno trecho da via foi assim batizado por iniciativa de seu filho, Zé Moraes, que decidiu ceder parte de seu terreno para a Igreja Católica e para a Prefeitura de Juiz de Fora.

Falecida há 62 anos, Ana Maria da Fonseca não teve uma atuação direta na comunidade, mas sua memória foi perpetuada por seus fortes laços familiares. Seu filho, um antigo morador do bairro Filgueiras e proprietário de grandes extensões de terra, quis homenageá-la ao doar parte do espaço que antes pertencia à família. Apesar de ser um pequeno trecho de rua, sua existência reflete como espaços urbanos podem carregar histórias íntimas e pessoais, nem sempre conectadas à participação pública, mas ainda assim significativas.
Do beco dos cachorros à história ferroviária
Rua Maria Conceição Riani


A Rua Maria Conceição Riani, localizada no bairro Filgueiras, carrega uma história de mudanças de nome e de identidade. Inicialmente chamada de "Rua Beco dos Cachorros", devido à grande quantidade de cães no local, depois passou a ser conhecida como "Nossa Senhora Aparecida". Foi apenas quando o vereador Geraldo Moreira Castilho iniciou seu mandato que o nome Maria Conceição Riani foi oficializado, sem que houvesse a participação direta da Prefeitura no processo.
Maria Conceição Riani era moradora do bairro e esposa de um agente ferroviário da Estação de Comendador Filgueiras, o que a tornou uma figura de referência na região. Sua nomeação como patrona da rua mostra como as periferias muitas vezes encontram formas próprias de valorizar suas lideranças locais, mesmo quando o poder público não
dá a devida atenção a esses territórios.

Resgatando memórias e reescrevendo a cidade
A nomeação das ruas pode parecer um detalhe trivial, mas carrega consigo as marcas de quem fez parte da construção da cidade. Em Juiz de Fora, o reconhecimento de figuras femininas nesses espaços ainda é escasso, e muitas dessas histórias acabam invisibilizadas. O Projeto Vielas busca lançar luz sobre essas narrativas, registrando não apenas nomes, mas as vidas por trás deles. Cada rua é um capítulo na história urbana que precisa ser contado e lembrado.
Por isso, as ruas mencionadas nesta reportagem, são mais do que simples endereços – elas representam fragmentos de memória de mulheres que, de diferentes formas, ajudaram a construir a história da cidade. Seja por meio do trabalho comunitário, da doação de terras ou pela força de sua trajetória, essas figuras femininas deixaram marcas que merecem ser reconhecidas.

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